sexta-feira, 31 de outubro de 2008

O tailleur em Coimbra
Ia adiantado o século XX quando se acendeu a discussão sobre a necessidade de as alunas da Universidade de Coimbra tirarem benefícios práticos do uso de um traje de tipo uniforme. Não ter traje académico fazia parte da identidade das académicas da UC desde 1891, ano em que contemporaneamente se matriculou a primeira aluna. A não participação feminina na vida associativa, a ausência de organismos culturais mistos até 1938 e a omissão da cerimónia de formatura de bacharéis e licenciados desde 1910, foram justificando a inércia observada em Coimbra. A nível dos liceus locais, mesmo considerando o Liceu Feminino Infanta D. Maria, nada consta quanto a um hipotético uso de farda, se considerarmos que a muito usada bata não era propriamente um uniforme.
As alunas da UC tinham o privilégio do uso de pasta com fitas e capa preta sem uniforme, costume que na década de 1980 ainda era praticado por quintanistas que iam ao Baile de Gala das Faculdades. Nos finais da década de 1940 este estado de coisas começou a mudar quase imperceptivelmente. As universitárias de Coimbra estavam a par do uso do tailluer nos liceus e no Orfeon Universitário do Porto. O peso crescentemente atribuído desde meados da década de 40 às latadas de começo de ano escolar e às cerimónias de imposição de insígnias (grelos no 4º ano, fitas no 5º ano), começaram a suscitar em alunas da Faculdade de Letras vontade de adopção de um traje académico. Nos festejos de Novembro de 1949, a estudante de Germânicas Ilda Pedroso desfilou com um conjunto saia/batina/capa, acontecimento muito comentado no millieu, mas bem acolhido. Todas as informações consultadas testemunham a opção pela saia, numa época em que os códigos vigentes não poderiam aceitar na mulher o porte de calça comprida, e a batina masculina abaixo do joelho (frock coat), com lapelas de cetim.
Parecia encontrada a solução, numa instituição onde a cultura histórica não legitimava de ânimo leve nem o tailluer, nem uma distinção formal entre modelo masculino e modelo feminino. A breve trecho, a evolução seria bem outra. Em 1951 as alunas do Teatro dos Estudantes (TEUC) preparam uma digressão ao Brasil, tendo decidido levar um conjunto prático que substituísse os custos e os incómodos habitualmente havidos com os vestidos de gala. Ficou decidido levar nas bagagens o tailleur preto, traje que em diferentes padrões cromáticos era então usado no Ocidente por enfermeiras militares e hospedeiras de aeronáutica civil. Nas revistas de moda, as estrelas de cinema e do musical deixavam-se fotografar com este tipo de fato. Entre 12 de Agosto e finais de Outubro de 1951 o TEUC actuou no Brasil e visitou a Universidade de São Paulo, onde deixou uma réplica da "cabra". De 1951 a 1954 não se sabe com rigor que nível de adesão o tailleur terá conhecido em Coimbra, que lhe possa ter grangeado ser mais do que o fato que as alunas do TEUC levaram ao Brasil. Uma coisa é certa, se estivesse popularizado e se fosse querido das estudantes, não teria havido necessidade de o impor por decreto.

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